Descrição
Começo agradecendo a confiança das Autoras e Autores, também dos Organizadores, para fazer o Prefácio. É uma honra, também uma grande satisfação. Ressalto o título muito engenhoso: Educação e Educações – desafios e conquistas. Aprendemos que educação vem no plural, porque hoje sabemos melhor que seres humanos são tão iguais, quanto diversos. A obra prima da natureza é a biodiversidade: não uniformiza seu processo criativo; ao contrário, permite infindas variações, nuances, tonalidades, matizes, porque só propostas autoritárias querem uniformizar tudo e fazer ordem unida. Tendo a natureza estruturas persistentes, como DNA, gene, códigos e gramáticas da vida, também se reproduz. Mas o que enche os olhos é proliferação, a cornucópia, a abundância. A ideia da pluralidade também condiz com uma obra coletiva, um grupo de cabeças pensantes: grupo mais interessante, também mais bonito, é o diverso, com cada qual trazendo contribuição própria, que sempre se superpõe aqui e ali, mas é autoria do grupo. O trabalho de pesquisa individual provavelmente não vai desaparecer, mas vamos preferindo, cada vez mais, o trabalho de grupo, também porque a interdisciplinaridade só é viável em grupo: interdisciplinar é o grupo de especialistas que se reúne para se misturar, sendo tanto melhor quanto mais diverso cada membro for. Um dia teremos também uma dissertação ou tese coletiva – é preciso regular isso, naturalmente – porque pode ser muito mais interessante, criativa, alternativa, do que um trabalho solitário.
Cabe reconhecer que, olhando para nossas escolas públicas, também para as universidades, é indisfarçável um senso de
cansaço, em grande parte pela mesmice de sempre. Alunos são desperdiçados sistematicamente, porque aprendem muito pouco, sobretudo matemática no Ensino Médio, onde aprendizado adequado residual é a regra. E isto há décadas, desde os tempos de Anísio Teixeira que se queixava disso insistentemente. Professores já não suportam mais ouvir que são importantes, mas são a imagem viva de que educação vale muito pouco e sua formação na universidade continua precaríssima. Estamos saturados de avaliações oficiais, sobretudo do Ideb, ou do Enem, não só porque são sempre uma ducha de água fria, mas também porque o susto não leva a nada. Quando nos informam que, no Enem de 2020, apenas 28 candidatos redigiram bem, dentre perto de 3 milhões, significa que ninguém redige bem. A escola teria capitulado, o professor também. Sabemos disso. Mas não resulta nada. No próximo Enem teremos o mesmo pesadelo.
Alguns dizem que somente os alunos podem mudar a educação, porque são as vítimas. Há sabedoria nessa expectativa,
mas há também nos pesquisadores e educadores, a exemplo dos que aqui se reuniram para colaborar. Para consertar a escola
precisamos de um grande concerto: todos são importantes para colocar em marcha um movimento significativo e abrangente de mudança. Este livro ensaia este concerto. Na BNCC consta no capítulo sobre Ensino Médio a “recriação da escola”. Ainda acho que é um ato falho, porque não combina com o texto conservador e instrucionista. Parece cair do céu. Não resultará nada, porque não é uma formatação curricular que muda a escola. É, no entanto, surpreendente que se diga ser necessário “recriar” a escola – não vale reformar, é preciso mudar tudo. Embora o mais provável seja não mudar nada, todos sabemos que é preciso mudar tudo. Assim, parece-me um começo formidável partir da ideia das EDUCAÇÕES, para sugerir que precisamos sair da camisa-de-força atual e enveredar por outros caminhos exploratórios. O livro é uma grande exploração de ideias plurais, arregimentando uma plêiade de autoras e autores que querem contribuir para mudar a educação pública. Os desafios são absurdamente concretos: quando um aluno termina o Ensino Médio, no qual o aprendizado adequado de matemática é de 5%, significa que 95% não aprenderam bem. Foram 12 anos desperdiçados. Quando, nos Anos Iniciais, temos, por vezes, um desempenho superlativo perto de 100%, com destaque para a escola municipal do pedagogo, mas nos Anos Finais, cai a 20%, um lapso enorme do licenciado na escola estadual, nos perguntamos sobre como pode isso acontecer… Algumas escolas fazem coisas incríveis, com o charme de serem municipais. Outras, como as escolas estaduais, parecem paradas no tempo, não por culpa docente ou da escola como tal, mas porque são freadas no tempo, começando pela formação muito deficiente na universidade, ao lado de condições muito difíceis de trabalho, não esquecendo, nunca, que muitos alunos são parte de comunidades muito marginalizadas e isto interfere contundentemente na aprendizagem. Talvez ainda insistamos demais no “ensinar”. Se aceitássemos que professor é profissional da aprendizagem (ensino vai ficando para o computador, sobretudo se for só para repassar conteúdo curricular), poderíamos tentar outras abordagens voltadas para atividades de aprendizagem na escola, não de reprodução curricular. É fundamental cuidar da autoria dos estudantes e isso pede professores autores, cientistas, pesquisadores.
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